“Meu nome é Sebastião Bueno, a maior dificuldade que tenho como deficiente visual é localizar o número. Esses dias eu estava andando na (rua) Monsenhor Celso, precisava chegar a um chaveiro, na altura do número 128, e passei um pouco. Tinham duas mulheres conversando à minha direita, e eu perguntei para a primeira: ‘por gentileza, o número 128, em que altura se encontra?’ Ela respondeu ‘eu não sou daqui, eu sou de São Paulo’ E por acaso o número em São Paulo é diferente?!
Na porta do ônibus, eu vou perguntar: ‘que ônibus é esse?’. Só o silêncio responde. Aí o motorista liga o motor e vai embora. O que custa abrir a boca pra falar ‘é’, ‘não é’? Que nem outro dia, cheguei no ônibus lá: ‘é o Érico Veríssimo?’ (silêncio) ‘É o Érico Veríssimo?’ (silêncio) ‘Não tem nenhum filho da puta que fala aqui?’ Ai um cara falou: É, é o Érico Veríssimo. Pois é, é normal isso aí! Anormal é alguém chegar e oferecer ajuda como você fez.

Eu sou lá do Noroeste. Nasci em Marumbi, à época município de Jandaia do Sul. Marumbi não tinha situação política, então era comarca de Jandaia do Sul, tanto é que minha identidade saiu por Jandaia do Sul. Mas eu to aqui em Curitiba desde o dia 15 de março de 70, às 22h30, e aqui to até hoje.
Perdi uma vista com cinco anos, com uma pedrada, e como nossos olhos estão interligados, pelo não tratamento perdi a vista da direita também, aos treze anos. Então até os treze anos eu enxerguei tudo, e hoje não vejo nada. Só a escuridão. Não é fácil não, mas ainda tem coisa pior que a minha.

Conheço um cara, rapaz, que tem uns noventa quilos, e não mexe um dedo, por causa de um tiro que pegou nas costas. Ele enxerga, fala, mas você pode passar a faca nele que não sente nada. Uma judiação. Precisa de três pessoas pra dar banho, três pessoas pra por em cadeira de roda, pra por na cama… É um gigante o cara.
Estudei até certa altura, mas devido às dificuldades financeiras tive que parar pra trabalhar. Eu tive que optar: estudar ou trabalhar. E eu optei por trabalhar. Mas não me arrependo, não.

É um pensamento meu: ‘nunca se esmoreça diante do primeiro obstáculo’. Se você fizer isso, você será um eterno fracassado. Isso aí é um provérbio meu. Você não vai achar em lugar nenhum.
E tem pessoas que, sei lá, não sei se pela motivação psicológica, financeira, emocional, sei lá o quê, diante do primeiro obstáculo, cai. E não é essa a meta. Se você caiu, tem que levantar de volta. Se você não levantar, não vai conseguir andar mais, vai ficar no chão. Continua a caminhada. Isso vai de cada ser, de cada íntimo, de cada personalidade, acima de tudo.”

JP – CURITIBA – JULHO DE 2015

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