“Eu sou o Zé, Zé dos Santos. Tô há cinco anos nesse cemitério. O que a gente faz aqui? Nóis varre. Moro no [distrito de] Irerê, mas sou mineiro de Novo Cruzeiro, pra lá de Santo Antônio. Lá nóis passava nome. Meu pai trabalhava carpindo pros outro. Era roça braba, solzão, mixaria danada. Tenho três irmãos. Naquela época eu não trabalhava, não fazia nada. A escola era muito longe. Agora minha vidamelhorou, nem se compara. Aqui é riqueza, até os mindingo da rua é rico, come mior que os que trabalha. Essa crise braba, nóis passou muito… Meu pai sofreu pra criar nóis, foi meu tio que tirou nóis de lá. Vendemo porco e galinha pra vir pra cá, era o que a gente criava, e serviu pra pagar a passagem. Cheguei aqui e trabalhei de boia-fria, colhia algodão, chegava a colher quinze quilos de algodão. Naquela época eu bebia, gostava de uma cachacinha, mas já faz vinte anos que parei. Já briguei muito, quando bebia, todo bêbado briga, né? Agora graças a Deus tamo levando a vida, né? Se cemitério tem muita história? Só se for à noite, porque às cinco já tô indo embora e não vejo nada [risos]. Não tenho filhos. Sou amasiado, fui casado mas não deu certo, não. Acho que não tenho mais nenhum sonho. O que eu desejo é ficar rico, mas não consigo. Com a riqueza eu queria comprar um sítio pra mim, uma fazendinha, e não casa na cidade. O que eu aprendi na vida foi trabalhar. Só pensava em trabalhar pra não passar fome. Queria ter aprendido a ler, tenho essa vontade, mas não consigo, não posso parar de trabalhar, e quando saio daqui já escureceu.”
JP – LONDRINA – SETEMBRO DE 2015