“Meu nome é Eduardo Antonio Souto Flores, eu nasci em Santiago do Chile. Vim pro Brasil em 79, tô com 49 anos e trabalho com quadrinhos. Meus pais são chilenos. Quando entrou o Pinochet, eles acharam melhor saírem de lá. Morreu um milhão de pessoas em 73, era um genocídio. E tinha um tio que morava aqui já. O Brasil é mais que uma segunda casa pra mim, a minha infância eu passei aqui. De chileno eu só tenho o DNA, eu sou meio brasileiro, só não como e milho e cuspo no chão. Mas ainda tenho minha cultura de chileno, vou pra lá de vez em quando. Eu sempre li quadrinhos, já lia no Chile, aprendi a ler com cinco anos. Mesmo moleque eu colecionava tirinha de jornal. Não tem mais preconceito, quadrinho é um livro ilustrado, é só isso. Um puta roteiro com um puta desenho. Eu faço alguns roteiros, mais por brincadeira. Sou auxiliar técnico de edificações e mecânico, hoje só por hobby, mexo com moto antiga. Construí minha própria moto, de fundo de quintal. Nos anos noventa, fumei um baseado com o Angeli, aqui no Carbono 14. Foi meio banal, mas na época era perigoso. Eles tavam fumando, pintou, eu fumei. Se hoje eu faria de novo? Não, não preciso mais fumar. O Angeli é um cara sensacional, deveria ter um lugar de honra, o Glauco, o Laerte, ou Dona Laerte, porque tanto faz o gênero, não interessa, é um gênio. É o que o Brasil tem de autor, Lourenço Mutarelli, gênio do quadrinho underground. O ‘Cheiro do Ralo’ é melhor que ‘Trainspotting’. Explora outro tipo de droga, a droga da vida.”
JP – SÃO PAULO – SETEMBRO DE 2015